28
Nov 08

 
(Fernando Baleiras)
Espasmos de anseio que auguro
Donde longínquo mora teu espanto
Vem buscar-me! Só, carrego tanto
A pressa de te dar o meu encanto
 
Arredio instante de alva promessa
Migando a noite aluada de espera
Resguardo de mim a seiva que te teça
Ocaso que me funde na tua quimera
 
Aporto, chegando repentina
Para sentir o gosto da tua boca a roçar
Em recantos lívidos de desvario
Na perversa vontade de te tocar
 
E eu assim dormente de te ter
Arrasto-te na fímbria do meu prazer
E no madrugar de êxtase premente
Se entrosa o impulso do suceder
 
Sublimação…!
No ocre do tempo em penumbra
Desejo austero que quero meigo
Como mar paixão, que ante me deslumbra!
  

 

publicado por Utopia das Palavras às 10:05

23
Nov 08

                                                                                           

Saberei eu definir o sabor do azul?
Saberei ler os meus próprios olhos
Quando inundados...
Agitam luas de todos os sentidos?
 
 
Saberei eu um dia ler na raiz
Da frondosa árvore e da sua seiva
Inventar enigmas de mel?
 
 
Certa que descobrirei no luto                        (joan miró)
Das riscadas asas dos pássaros
Amputadas pelo vendaval dos ninhos
 
 
E saberei olhar-te com ancestral avidez                          
Trespassar-te com eróticos compassos
Do ondular do meu corpo
E delirando, saberei chegar-te!
 
 

 

publicado por Utopia das Palavras às 21:29

18
Nov 08

 

Nesse imenso mar índigo e chama
Fogueado em grãos de ouro e prata
Em espraiadas maresias, meiga cama
Onde eu adormecia pacata
 
Efémera foi a paz, onde a tenho?
Recortes de quietude, sonhos lugares
Praias e serros meus, hoje engenho
Vencidos e sós, são os meus mares
 
 
 
Arribas, chorões, silvas e dunas
Massacres de tantas dores
Áureos desertos, mira de fortunas
Parda cegueira de mercadores
 
Rendada serra, alcanço de mar
Conquistando mouros e ilhas
Tantas milhas para acercar
Ostras, medronhos e conquilhas
 
Eu petiza, desafio de montes e marés
E o grito das gaivotas bailando corridinhos
Amávamo-nos, descalça, veludo meus pés
Simbiose de anil, acordeão e ferrinhos
 
Areias de açúcar vizinhos da serrania
Meus promontórios, esconderijos de amor
Onde selvagem uma roseira nascia
Impunes, prosperam cimentos de rancor
 
Nostalgia minha, cruel certeza
Remotos sapais de luas salinas
Minha ria, ai espelho de tristeza
Formosa e bravia, és recreios e marinas
 
E eu? E nós que a amamos singela
Amor de sol, iodo, conchas e figueiras
Indefesos meus olhos, gotas de sal por ela
Buscam sentido no olhar das amendoeiras!

 

publicado por Utopia das Palavras às 22:17

13
Nov 08

(Jose Penincheiro)

Longínquos lugares que amei
Lugares de encanto maior
Húmidos arrozais que caminhei
Em campos a gemer de cor
 
Cultivos outrora riqueza
Tão verde amarelo  trigal
Suculentos pedaços de beleza
Espelhos de colo maternal
 
Ora vejo e não sinto o fulgor
Perenes a palpitarem os campos
Amálgamas em explosão e suor
Com archotes de pirilampos
 
Cheiros aragem campestre
De brisa que sabia a tomilho
Aromas dum olhar silvestre
Saudades do trigo e do milho
 
Esguias papoilas aos molhos
Vermelho e sol em melodia
De corpo frágil os olhos
Negros de fortuna vadia
 
Meus olhos de água ribeiras
Juncos beirando açucenas
Ecos do canto das lavadeiras
Lavando na pedra suas penas
 
Moinhos fingindo ventos
Velas rodando com ânsia
Mós em rodopios de lamentos
Genuína saudade de infância!

 

publicado por Utopia das Palavras às 22:30

09
Nov 08

 

 

 (mark chagall)

Para vocês companheiros
Flores, faluas, beijos guerreiros
Amigos de fronte, de laços e ouvido
Ombros onde me encosto e desfaço
Hesitações e tombos, num abraço
Para vocês…um poema sentido!
 
Se um dia me era dado escolher
Na vida, o que era meu desejo ter
Tesouros, ouro ou diamantes
Essa riqueza eu não queria
Pois desventurada sempre seria
Sem o zelo dos meus infantes
 
Infantes da nau da minha descoberta
Faróis guieiros, se parto incerta
São a fibra que eu preciso
Descolorida a vida seria
Nascer, brilhar, crescer é magia
No alegre bailar do seu sorriso
 
Dos autos que dramatizo
Em marionetas de choro e de riso
São morada certa que me abriga
E pelo que aprendo no livro que são
O meu afecto e feixes de gratidão
E estes versos...de amiga!

 

publicado por Utopia das Palavras às 17:02

03
Nov 08

 (guayasamin)

 
No vale profundo
Ecoa um grito
Gemido aflito
De gentes do mundo
 
Grito que alivia
A alma oprimida
Das fráguas da vida
Da mente que jazia
 
Grito da terra
Sonhos ambíguos
Em tempos exíguos
De fome e de guerra
 
Grito quão malvado
Da fúria que insiste
E nos homens existe
Em nós sufocado
 
Grito... liberto
De mãos desatadas
Auroras amadas
De escolhas coberto
publicado por Utopia das Palavras às 22:02

"Balada da Liberdade" livro de Miguel Beirão, prefácio de minha autoria e capa de Dorabela Graça
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